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E agora, de quem é a culpa?

por Nicole Corrêa Roese

Nos primeiros momentos ficamos impactados. A reação é de solidariedade com quem mais precisa. Abrigo, acolhimento, alimentos, vestimenta, abraços e braços amigos. Logo à frente, hora de recomeçar. Limpar o que lameou a vida. Reconstruir. E como foi compartilhado, “não é hora de procurar os culpados”.

Passam os dias e agora semanas. E também chega a hora de querer ouvir respostas: por que nós? Por que aqui?
Na tentativa de responder, faz-se uma disputa política. E é necessário que se faça. Porque política é a arte de pensar a vida coletiva. Identificar problemas e pensar soluções. E isto a partir de experiências que se vive. Os feitos e desfeitos são uma oportunidade de aprendizado. Estão em pauta questões ambientais mais amplas. Não se trata apenas de uma política local. Escrevemos que a solidariedade será consistente se abraçarmos também esta causa global. Mas não podemos deixar de avaliar a governança que tem a responsabilidade de prevenir e enfrentar tais situações que foram previstas e anunciadas. Poderíamos ter evitado? Sim, porque nossa intervenção exploratória não respeitou limites. Poderíamos diminuir os efeitos destas mudanças climáticas que estamos enfrentando? Sim, porque podemos estabelecer prioridades e investimento em pessoas quando pensamos nas estratégias de habitação e ocupação urbana e rural.

Na ânsia das respostas, assusta-me o caminho que algumas interpretações anunciam. Há quem aponte para a fúria de Deus diante do pecado dos gaúchos. E não se trata de um fato isolado. Ao menos três vozes públicas: uma influencer, um padre e um prefeito, em diferentes estados (MG, MS e SC) bradaram em alta voz a acusação de que gaúchos estariam abandonando a verdadeira fé para se entregar aos terreiros, aos “centros de macumba”. Apela-se a estatísticas de que o RS é o estado que “menos tem igrejas”. E então Deus estaria enviando recados de conversão. Assusta-me porque tais interpretações encontram amplificação também entre pessoas mais próximas.

E assim como o odor pútrido dos bueiros, escorrem pelos nossos caminhos um odor pútrido destes esgotos da humanidade: a intolerância religiosa e a demonização do diferente.
Tenho fé que saberemos superar e nos purificar. E que seja um gesto coletivo e solidário.

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