Trump se elegeu presidente dos EUA com a promessa de deportar imigrantes “ilegais”. Promessa feita, promessa cumprida. E com efeito de mídia. Muitas pessoas embarcando em aviões do exército norte-americano algemadas. Indicação de serem consideradas pessoas perigosas e até criminosas.
Uma espécie de limpeza étnica. Fortalecendo o pensamento de que “se não é dos nossos ou não de acordo com os nossos, também não merece desfrutar do que temos.”
Fico a imaginar se a moda pega.
Um determinado bairro poderia despejar migrantes indesejados. E não seria difícil cooptar o voto favorável da maioria dos moradores: “não sendo dos nossos não merece estar entre nós”. Uma cidade poderia também estabelecer estas fronteiras e critérios. Não tendo raízes nas famílias locais, que passe adiante. Neste caso, já há quem o faça, ainda que de forma discreta ou disfarçada. Noutra situação, uma escola também poderia adotar o mesmo critério: se não for da comunidade, não pode estudar.
Os territórios e fronteiras passariam a ser administrados no modelo condomínio, com cercados e guaritas de controle. E com um detalhe: a regra vale sem efeito retroativo. Caso os pais, num passado não muito distante, tenham também se caracterizado como migrantes ilegais, passam a ser lembrados como desbravadores e heróis. Os tempos e as regras eram outras.
E, no entanto, a liberdade não pertence aos que constroem e impõem fronteiras. Os muros e as cercas condenam os que estão pelo lado de dentro. É uma espécie de confissão da não liberdade. Medo e a insegurança diante de quem está livre, do outro lado.
Os povos originários, estes sim os legítimos ocupantes dos territórios, não construíam muros ou cercas. Respeitavam fronteiras que a própria geografia ou o direito do outro existir delimitava. Os biomas do planeta ocupam territórios próprios com limites mais ou menos delimitados. Mas num complemento harmonioso.
Os gregos criaram o conceito de oikos para se referir ao espaço habitado por nós e pelos elementos da natureza como casa comum. Daí a palavra ecologia como sinônimo de cuidado do que é comum. A ordem do universo cobrará a conta de quem impõe desordens.
É uma desordem que alguém ou alguns se achem no direito de se adonar do que pode ser comum.
Ja é assinante?
Faça seu login agora mesmo, e tenha acesso a todo o conteúdo exclusivo.