Registro inédito do animal, já conhecido na Argentina, reforça a importância da colaboração internacional para a conservação da espécie e acende alerta sobre os riscos de emalhe em redes de pesca.

Uma baleia-franca-austral, batizada de “Guerreira”, foi registrada pela primeira vez na costa brasileira em 22 de junho de 2025, um evento que celebra a resiliência da espécie e fortalece os laços de pesquisa entre Brasil e Argentina. A fêmea adulta de 14,3 metros, que carrega as marcas de uma batalha pela sobrevivência, foi identificada pela equipe do Projeto Farol das Baleias (PFB).
O avistamento faz parte da série quinzenal de reportagens do Grupo Maristela em parceria com o projeto, que visa aproximar o público da ciência e da conservação ambiental. Todos os anos, as baleias-francas-austrais migram para o sul do Brasil em sua temporada reprodutiva, buscando águas mais quentes para dar à luz ou acasalar. O Projeto Farol das Baleias, uma iniciativa do Grupo de Estudos de Mamíferos Aquáticos do Rio Grande do Sul (GEMARS), monitora essa jornada desde 2002.
De acordo com os pesquisadores do projeto, a identificação individual de cada baleia é uma peça-chave no quebra-cabeça da conservação. Utilizando drones desde 2020, eles realizam filmagens aéreas que permitem o reconhecimento de cada animal pelo padrão único de calosidades em suas cabeças. Essas calosidades, colonizadas por pequenos crustáceos conhecidos como “piolhos-de-baleia”, funcionam como uma impressão digital. Graças a essa técnica, o projeto já catalogou 504 baleias adultas, das quais 403 são fêmeas que foram vistas ao menos uma vez com seus filhotes.
A GUERREIRA
A história de “Guerreira” começou a ser documentada em 2019, na Península Valdés, Argentina, pelo Instituto de Conservación de Ballenas (ICB), onde foi catalogada como a baleia de número 5593. A pesquisadora do Projeto Farol das Baleias, Ticiana Fettermann, compartilhou uma imagem recente do animal com a equipe argentina, e a confirmação veio através do padrão distintivo das calosidades e de uma profunda lesão no pedúnculo caudal. “Guerreira”, que nunca foi vista com um filhote, agora tem seu primeiro registro em águas brasileiras.
“Foi muito interessante registrar essa baleia pela particularidade das calosidades e pela grande ferida, provavelmente causada por emalhe”, comentou Ticiana.
“Entre os pesquisadores da Argentina e do Brasil, decidimos chamá-la de “GUERREIRA”, como símbolo da força para sobreviver apesar dos ferimentos, e também para refletir a conexão entre Brasil e Argentina, porque as baleias unem países”, explica a pesquisadora.
PERIGOS NO MAR
A cicatriz que “Guerreira” carrega é um lembrete sombrio de uma das maiores ameaças que estes gigantes enfrentam: o emalhe em redes e cordas de pesca. Embora demonstre a incrível capacidade de resiliência desses animais, o ferimento sublinha a necessidade urgente de esforços de conservação transfronteiriços para proteger a população de baleias-francas que transita entre os dois países.
O trabalho de “recaptura”, quando um indivíduo já conhecido é registrado novamente, é fundamental para entender os padrões migratórios, a saúde e a demografia da espécie. Exemplos notáveis de recapturas anuais pelo projeto incluem a baleia FB-332, apelidada de “Tigresa”, registrada com filhote em 2023 e solitária este ano, e a FB-219, avistada com filhote em 2022 e novamente em 2025.
A colaboração entre pesquisadores e instituições de diferentes países, como a que permitiu identificar “Guerreira”, é essencial para a proteção efetiva das baleias-francas-austrais. A jornada deste animal não apenas conecta nações, mas também destaca a responsabilidade compartilhada de garantir que essas criaturas majestosas possam continuar a navegar em segurança pelos oceanos.

