Julho Amarelo alerta para os riscos das hepatites virais. Mesmo sem sintomas, essas doenças podem causar cirrose e câncer no fígado. Testar-se e prevenir é fundamental.

Durante o Julho Amarelo, mês voltado à prevenção das hepatites virais, o município de Torres acende um alerta. A hepatite C é a mais frequente entre os casos tratados recentemente na rede pública de saúde. Em 2024, 15 moradores iniciaram tratamento para o vírus HCV, com 100% de cura. Em 2025, até o momento, mais cinco pacientes iniciaram o protocolo. Embora o índice de sucesso seja motivo de alívio, os dados revelam algo preocupante, a maioria dos infectados (67%) são homens entre 50 e 59 anos, com contágio ligado ao contato com sangue contaminado.
Segundo a enfermeira Thaís Gonçalves, do Serviço de Atendimento Especializado (SAE) da Secretaria de Saúde de Torres, os números confirmados representam apenas uma fração da realidade. “Os casos tratados são a ponta do iceberg. Muitos seguem sem diagnóstico, porque a hepatite C costuma não apresentar sintomas por anos”, destaca.
TIPOS DE HEPATITE E PREVENÇÃO
As hepatites virais são inflamações no fígado causadas por cinco tipos de vírus: A, B, C, D e E. No Brasil, os tipos B e C são os mais perigosos, pois podem evoluir de forma silenciosa para doenças graves, como cirrose e câncer no fígado. Em Torres, nos últimos dois anos, não houve registro de novos tratamentos para hepatite B, apenas cinco pacientes seguem em acompanhamento.
As hepatites A e E, transmitidas por alimentos ou água contaminados (via fecal-oral), costumam ser passageiras e não se tornam crônicas. Já as hepatites B e C precisam de mais atenção, pois são transmitidas principalmente por sangue contaminado, e no caso da hepatite B, também por relações sexuais desprotegidas, uso de seringas compartilhadas, materiais cortantes não esterilizados e da mãe para o bebê durante a gestação.
Apesar de o controle em transfusões de sangue ter aumentado nos últimos anos, o risco atual de infecção por hepatite C está ligado ao compartilhamento de objetos perfurocortantes. Isso inclui alicates de unha, lâminas de barbear, materiais de tatuagem e piercing, especialmente em locais sem condições adequadas de higiene. “Já atendemos pacientes que se infectaram após fazer uma tatuagem caseira, anos atrás, com materiais contaminados”, conta Thaís.
DOENÇA SILENCIOSA, MAS PERIGOSA
A médica ginecologista e obstetra Andreia Castro reforça que a ausência de sintomas torna as hepatites B e C ainda mais perigosas. “Quando os sintomas aparecem, o fígado já pode estar muito comprometido. Por isso, testar-se com antecedência é essencial”, orienta.
Apesar de mais rara, a hepatite C também pode ser transmitida por via sexual ou da mãe para o bebê. Contudo, a maior parte das contaminações ainda ocorre por meio do contato com sangue contaminado. Microcortes na pele já são suficientes para que o vírus entre no organismo, se houver contato com sangue infectado.
Importante esclarecer! A hepatite C não é transmitida por abraços, beijos, talheres ou copos. Os cuidados devem se concentrar no que envolve contato com sangue ou objetos cortantes.
Atualmente, não há vacina contra hepatite C, mas o tratamento, gratuito pelo SUS, tem alto índice de cura. Já a hepatite B pode ser prevenida com vacina, também disponível na rede pública, assim como a vacina contra hepatite A.
TESTE RÁPIDO PODE SALVAR VIDAS

Durante o Julho Amarelo, a campanha reforça a importância da testagem gratuita oferecida em todas as Unidades Básicas de Saúde (UBS) de Torres. O exame é simples, feito com uma gota de sangue retirada do dedo, e o resultado sai em cerca de 20 minutos. Se o teste der positivo, a pessoa é encaminhada para acompanhamento no SAE, onde faz exames complementares, consultas médicas e, se necessário, inicia o tratamento, tudo pelo SUS.
“É um procedimento rápido, indolor e pode salvar vidas”, afirma Thaís. A recomendação do Ministério da Saúde é clara: quem tem mais de 40 anos e nunca fez o teste deve procurar uma unidade de saúde. Também devem ser testadas pessoas que tenham feito tatuagens, piercings, cirurgias ou transfusões antes de 1993, além de quem já compartilhou lâminas, agulhas ou outros objetos cortantes.
“Mesmo sem sintomas, o vírus pode estar atacando o fígado. E quando aparecem os sinais, pode ser tarde”, alerta a médica Andreia. Para ela, a testagem deveria ser rotina, especialmente entre adultos sexualmente ativos ou com histórico de exposição a riscos.
VACINAR É PREVENIR
A vacina contra hepatite B está disponível para todas as faixas etárias nas unidades de saúde, sem necessidade de receita médica. São necessárias três doses para garantir a imunidade. Já a vacina contra hepatite A é destinada a crianças entre 15 meses e 4 anos, 11 meses e 29 dias.
Mesmo com a ampla oferta, a cobertura vacinal ainda está abaixo do ideal. Um dos motivos, segundo especialistas, é a desinformação. “Nos últimos 20 anos, cresceram os discursos antivacina. Isso compromete a proteção da população”, diz a médica Andreia. “A vacina só protege se for aplicada. Não basta querer, é preciso agir.”
Ela lembra que o exame anti-HBs, feito com uma amostra de sangue, indica se a pessoa desenvolveu imunidade após a vacinação contra hepatite B. Se o resultado for negativo, é necessário repetir as doses.
Durante o pré-natal, gestantes devem obrigatoriamente fazer o teste. Se diagnosticadas com hepatite B, o bebê deve receber a imunoglobulina ao nascer e, em alguns casos, a amamentação precisa ser adiada temporariamente.
A enfermeira Thaís destaca outro ponto preocupante: em 2024 e 2025, Torres não iniciou novos tratamentos para hepatite B, mantendo apenas cinco pacientes em acompanhamento, todos homens de 50 a 59 anos. “Isso pode ser um sinal de prevenção eficaz, mas também pode indicar subnotificação por falta de testagem e vacinação”, alerta.
PROCURE ATENDIMENTO
Os sintomas de hepatites B e C costumam ser sutis: cansaço, mal-estar, urina escura, fezes claras e, em casos mais avançados, icterícia (pele e olhos amarelados). Por serem facilmente confundidos com outras doenças ou passarem despercebidos, o diagnóstico acaba sendo tardio. E isso aumenta os riscos.
As formas crônicas das hepatites podem evoluir para cirrose ou câncer de fígado, tornando o transplante a única solução. No Brasil, mais de 70 mil pessoas aguardam na fila por um órgão. “Tratar cedo é evitar complicações sérias e até a necessidade de um transplante”, reforça Andreia.
INFORMAÇÃO SALVA VIDAS
Em tempos de internet e redes sociais, o excesso de informações nem sempre vem de fontes confiáveis. A médica deixa um alerta: “Tem muita gente parando tratamento por causa de vídeo ou post sem base científica. Saúde se faz com profissionais e ciência. Cuidado com o que você acredita.”
A negligência com a vacinação já permitiu o retorno de doenças erradicadas, como sarampo e poliomielite. O mesmo pode acontecer com as hepatites, se a população continuar adiando a prevenção.
O chamado é claro: pais, mães, jovens, adultos e idosos, cuidem-se. A hepatite não escolhe idade, classe social ou religião. Ela se aproveita da distração, da falta de informação e da falsa sensação de segurança.
Procure a unidade de saúde mais próxima. Faça o teste. Atualize sua caderneta de vacinação. A sua vida, e de quem você ama, pode depender disso.